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08 Abril 2019

Novo beato Frei Carlos de Deus Murias: jovem frade torturado e assassinado pela ditadura argentina

Escrito por  Paolo Mastrolilli, publicada no jornal La Stampa, 19-03-2013, por IHU notícias

"A causa para a canonização – conta-nos o Frei Carlos Trovarelli, assistente geral para a AL dos franciscanos conventuais – foi assinada pelo próprio Bergoglio em maio de 2011. E ele o fez com discrição, para evitar que fosse bloqueada por outros bispos argentinos, ainda contrários a tais iniciativas baseadas no compromisso social dos sacerdotes".

Carlos Murias nasceu em 1945, em Córdoba. O pai era um rico agente imobiliário e um político muito conhecido na região. Para o seu filho, ele havia imaginado uma carreira de soldado e o havia inscrito na Escola Militar, mas logo depois dos estudos, Carlos entrou no seminário e pouco depois foi ordenado presbítero por Dom Enrique Angelelli, bispo militante de La Rioja, famoso pela sua pastoral dos camponeses. 

A situação naquela província era um retrato fiel dos desequilíbrios do país inteiro: poucas famílias muito ricas que controlavam tudo, e um monte de trabalhadores reduzidos quase à escravidão. Dom Angelelli havia se colocado contra isso, e Frei Murias havia sido enviado para ajudar os agricultores em uma pequena cidade chamada El Chamical, juntamente com o padre francês Gabriel Longueville. Ele devia fundar uma comunidade franciscana, quando os militares deram o golpe. 

Ele começou a receber avisos, convocações aos quartéis, onde os soldados lhe explicavam que "a sua Igreja não é a em que acreditamos". Frei Carlos continuou firme e, no dia 18 de julho de 1976, foi sequestrado junto com Gabriel. Foi preso na Base da Força Aérea de Chamical, e dois dias depois o seu cadáver foi encontrado no meio de um campo: havia furado os seus olhos e cortado as suas mãos, antes de fuzilá-lo.

Dom Angelelli celebrou o funeral atacando os militares: "Atingiram onde sabiam que ia doer mais. Fui eu que ordenei Frei Carlos, e eu o coloquei em uma condição de perigo". Duas semanas depois, um Peugeot 404 encurralou o carro de Dom Angelelli, enquanto ele viajava para La Rioja: o carro do bispo capotou, e ele morreu. A polícia arquivou o episódio como um acidente, a magistratura agora está finalmente investigando o caso como se fosse um homicídio.

A parte menos conhecida dessa história é a reviravolta de Pe. Bergoglio (hoje papa Francisco), que agora foi revelada pelo padre Miguel La Civita, estreito colaborador de Dom Angelelli: "Eu o conheci durante os estudos. Poucos dias depois dos homicídios, ele pegou os nossos seminaristas e os escondeu no Colégio Máximo dos jesuítas, dos quais ele era o provincial. Não são histórias que eu ouvi contar: eu as vivi, em primeira pessoa. E que uma coisa fique bem clara: eu era o exato protótipo daqueles que então eram chamados de padres terceiro-mundistas, da teologia da libertação. Com a desculpa de retiros espirituais, o Colégio havia se tornado um centro para ajudar os perseguidos: eles os escondiam, preparavam os documentos falsos e os faziam fugir para o exterior. Pe. Bergoglio estava convencido de que os militares nunca teriam a coragem de violar o Máximo".

Quem também confirma isso é Alicia Oliveira, famosa magistrada perseguida pelos militares e que depois se tornou ativista dos direitos humanos: "Pe. Bergoglio também propôs que eu me escondesse no seminário: eu lhe respondi que preferia ser presa pelos militares, em vez de viver com padres. Ele começou a rir e disse que eu era uma tola: a posteriori, eu reconheço que ele tinha razão. Seguramente, eu sei que uma vez ele deu a um homem que se parecia com ele os seus documentos verdadeiros e uma veste de sacerdote, para fazê-lo escapar para o Brasil. Se isso não significa pôr tudo em jogo, sob a ditadura militar, então me explique o que é".

A morte de Frei Carlos Murias, porém, permaneceu dentro de Pe. Bergoglio. É difícil entender como certos episódios marcam a alma humana, em situações em que o perigo extremo se torna cotidianidade. "Os jesuítas – explicava Frei Carlos Trovarelli – são a vanguarda total. Eu acredito que a cúria geral ordenou atenção a Pe. Bergoglio, e ele teve que encontrar um modo de salvar as vidas sem expor demais as dos colegas".

O fato é que, assim que a diocese de La Rioja começou a prática para a canonização, o cardeal logo a assinou. Era maio de 2011, portanto, em tempos insuspeitos: nenhuma campanha papal no horizonte. "Dom Bergoglio assinou e nos aconselhou a sermos discretos: muitos bispos argentinos, principalmente os mais idosos, se opõem às causas baseadas no compromisso social. Graças à sua cautela, o processo seguiu em frente: os testemunhos acabaram e chegamos à preparação da positio. E agora Bergoglio é papa. A vontade de Deus faz milagres: seria comovente se o primeiro beato de Francisco fosse Carlos".

Quem foi Frei Carlos de Dios Murias? Sua biografia:

Frei Carlos de Dios Murias, foi um frei franciscano conventual, simpatizante das causas em defesa dos pobres, que, em 1976, foi torturado e morto por agentes da Ditadura Militar na Argentina, liderados pelo General Luciano Benjamín Menéndez, na Província de La Rioja (Argentina).

Frei Carlos Murias nasceu em 1945, em Córdoba, filho de um rico agente imobiliário que era um político muito conhecido na região. O pai pretendia que o filho seguisse uma carreira militar e o matriculou na Escola Militar, mas logo depois dos estudos, Carlos entrou no seminário e foi ordenado como sacerdote por Dom Enrique Angelelli, Bispo de La Rioja, famoso pela sua "pastoral dos campesinos".

Frei Carlos Murias foi enviado para realizar um trabalho pastoral junto com camponeses em uma pequena cidade chamada El Chamical, juntamente com o padre francês Rogelio Gabriel Longueville.

Em 24 de março de 1976, ocorreu um Golpe Militar na Argentina, e Frei Carlos Muria começou a ser ameaçado por militares que se opunham ao seu trabalho pastoral. No dia 18 de julho de 1976, Frei Carlos foi preso juntamente com Pe. Gabriel Longueville e com o leigo Wenceslao Pedernera, na Base da Força Aérea de Chamical. Antes de ser fuzilado, teve seus olhos foram furados e as suas mãos cortadas. Dois dias depois o seu cadáver foi encontrado junto com o do Padre Gabriel. Wenceslao foi fuzilado uma semana depois.

Seu funeral foi celebrado por Dom Angelelli, naquela oportunidade atacou os militares. Duas semanas depois, Dom Angelelli morreu em decorrência de uma acidente automobilístico provocado por outro veículo.

Em abril de 2008, Luis Fernando Estrella e Miguel Ricardo Pessetta, dois oficias aposentados da Força Aérea Argentina, foram presos por participação no assassinato de Frei Carlos Murias e Pe. Gabriel Longueville.

Em maio de 2011, o Arcebispo Metropolitano de Buenos Aires, Mário Jorge Bergoglio, que futuramente seria o Papa Francisco, assinou um documento em apoio à canonização (conhecido como "causa para a canonização") de Frei Carlos Murias.

O julgamento pelo homicídio de Frei Murias e Pe. Longueville foi concluído em dezembro de 2012 com a condenação a prisão perpétua de Menéndez, Estrella e do policial Domingo Benito.

No dia 14 de maio de 2018, a comissão de teólogos da Congregação para as Causas dos Santos iniciou o trabalho que poderá resultar na beatificação de Dom Enrique Angelelli, Frei Carlos de Dios Murias, Pe. Gabriel Longueville e Wenceslao Pedernera.

No dia 09 de junho de 2018, o Papa Francisco declarou como mártires: Dom Enrique Angeleli, Frei Carlos de Dios Murias, OFMConv. Pe. Gabriel Longueville e Wenceslao Pedernera.

Beatificação:

A beatificação será celebrada em 27 de abril de 2019 na cidade de La Rioja, na Argentina. Representando o Santo Padre, o celebrante será o Cardeal Angelo Becciu, Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. O Postulador Geral Frei Damian Ptratrac (OFMConv) cuida deste processo. O pontífice autorizou a Congregação para as Causas dos Santos a promulgar o decreto relativo a esses mártires em 9 de junho de 2018.

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