Há um compromisso entre santidade e política. Isto pode aparecer estranho e desconcertante à cabeça dos que querem blindar qualquer experiência de fé voltada para a política, e que pensam que são duas realidades que ordinariamente se creem separadas de fato e de direito. Está certo que são realidades que tem muitos significados e compreensões ambíguas; mas para o franciscanismo elas ganham um significado muito preciso. A santidade é uma realização extraordinária daquilo que se crê, daquilo que é o sonho e sobretudo do que é o amor. Política verdadeira é a prática para a uma transformação estrutural da sociedade baseada nos valores do Reino de Deus expressos no Evangelho. E isto não é exclusivo de uma elite protegida por movimentos, hierarquias e sagradas congregações. A santidade pertence a todos e a política com santidade leva a salvação a todas as camadas históricas sem nenhum preconceito ou ideologia.
O franciscanismo primitivo chegou a esta verdade através de uma ascese pessoal de contemplação e ação. Sustentaram as estruturas da vida com os valores do Evangelho: mudar a si mesmo, mudar as pessoas, mudar o mundo. Sabiam que isto não estava na ideologia dos interessados, mas na própria vontade de Deus. Não tem como descobrir a vontade de Deus sem levar em conta o momento histórico. Sabiam que não podiam haver santidade que não ame os mais privados de dignidade humana. Dizia o nosso Santo (que oficialmente será canonizado) Dom Oscar Romero: “É preciso defender aquele mínimo que é o máximo de Deus, o maior dom de Deus: a vida “(Oscar Romero, Sermão em 15/11/1980). Santidade e política supõem conversão para um modo diferente de ver o mundo na realidade, e misericórdia frente a todo sofrimento do povo. É levar a sério com muita responsabilidade a pergunta feita em Gn 4,10: “O que fizeste ao teu irmão?”.
O franciscanismo nos ensina que mais do que amar uma pessoa, é preciso amar uma comunidade, amar um grupo; não escolher apenas o indivíduo, mas a coletividade. Não basta o gosto pessoal, mas a busca da eficácia estrutural. Amor e santidade política é lutar por uma nova civilização humana por uma nova criação. Sem compromisso com isto a santidade é inútil. A amor feito santidade e política deu o sangue pela vida do povo. Pergunte se o político em quem você votou e a quem você defende com unhas e dentes daria o seu sangue por você e pelo seu povo. O amor cristão nos deu mártires que viveram e morreram com a força de Deus. Dizia o nosso Santo futuramente canonizado, Dom Oscar Romero: “Eu creio, irmãos, que os santos foram pessoas muito ambiciosas. E isto eu ambiciono também para todos e para mim: que sejamos grandes, ambiciosamente grandes, para que sejamos imagens de Deus e não possamos contentar-nos de grandezas medíocres”.
O franciscanismo não usou as dores dos pobres para a promoção pessoal. Mas encarnou a pobreza para ser igual à pobreza de Nosso Senhor Jesus Cristo. Não gerou apenas indivíduos santos, mas uma fraternidade de pobres que são santos. É a prática do Reino e do Evangelho que cria os consagrados, ordenados e professos e não os rituais de ordenação, de profissão simples ou solene. O franciscanismo ensina que o encontro com o Senhor vai do pessoal ao comum e o ponto de partida é o Evangelho da Libertação. É caminho à procura de Deus e da pessoa que sofre. Não é um culto à personalidade pessoal, mas levar um povo inteiro junto com a realização das obras. Ninguém chega à Terra Prometida caminhando sozinho.
(Autor: Frei Vitorio Mazzuco na série de artigos “Reflexões sobre a Dimensão Política do Franciscanismo”. Via: CarismaFranciscano)