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01 Setembro 2022

Realidade, memória e ficção: O leitor bíblico

Escrito por 

Fr. Víctor Ml. Mora Mesén, OFM Conv.

 

     Na sociedade em que vivemos, a influência dos meios digitais introduziu uma percepção da realidade muito diferente da que tínhamos alguns anos atrás. Antes, a realidade se limitava à experiência objetiva do que estava acontecendo, ao fenomenológico, entendido como manifestação material, cultural ou histórica do devir das coisas e percebido pelos sentidos, emoções ou razão. Hoje o real adquire contornos muito diferentes, pois a forma como é concebido passa também pelo universo codificado digitalmente, que separa o indivíduo do imediato e o transporta para o domínio do mediado e do não circunscrito a um contexto objetivo. Além disso, para muitos o que é transmitido pela rede mundial é mais real do que é percebido na experiência ordinária e direta. O que se vive no mundo digital passa a ser incontestável porque é fruto da opinião e, como o indivíduo não pode ser julgado pelo que lhe é lícito dizer ou pensar, acaba-se por identificar a verdade com o subjetivo. Não é necessário ser realista em sentido objetivo, mas criar ou ter uma opinião do que acontece ou da identidade pessoal ou aliena, independentemente de seus fundamentos. Claro, a opinião é apenas isso: momento fugaz e razão defendida no instante e, por tanto, mudável ainda freneticamente.

     Essa forma de pensar gera uma grande preocupação no âmbito do pensamento crítico, não só porque dispensa ao produtor de opinião da lógica, mas também porque não implica a necessidade de buscar bases sólidas ou evidências reais no que se discute: o pensar se torna independente de seu fundamento objetivo. Tudo isso repercute diretamente na formulação da inteligibilidade da fé: hoje a emotividade é exaltada em detrimento do fundamento histórico; o “gostoso”, a nível emocional-religioso, é preferível ao conteúdo objetivo de uma fé baseada na experiencia histórica compartilhada; como consequência, a exaltação do ego religioso é preferível ao compromisso comunitário, social ou político. Um professor de teologia me disse que ele pensava que o êxito do discurso moralista atual não tem bases no desejo de conversão pessoal, mas na exaltação de um ego que se reafirma como superior a outros, aos quais considera «moralmente» inferiores. Esta é uma observação muito interessante e oportuna, mas que tem necessidade de uma nuance: o narcisismo que esta postura implica é uma obsessão tão difícil de manter que termina sucumbindo na incredulidade e que pode sobreviver unicamente na repetição continua de um discurso que não se acredita né se quer viver, mas que se deseja impor aos demais -tal vez por um impulso perverso incontrolável, como aquele farisaico dos evangelhos. Como resultado, o caráter histórico da fé, como critério de confiabilidade heurística, deixa o seu lugar à oportunidade de satisfação imediata da necessidade sentida. Assim, a probidade doutrinal fica em segundo plano, independentemente das repercussões que essa opção tem na vida e na espiritualidade do Povo de Deus. O imediatismo dos “dons” supera a “razão” da graça e a objetividade do pensamento, que é deslocada pelo "ganho espiritual", não raras vezes recompensando ao facilitador da experiência religiosa (ministro, pregador, médium) com mais bens materiais que elevações contemplativas da alma.

     A teologia dogmática, porém, não é a única que sofre com esse retrocesso da compreensão da fé, também no campo da interpretação bíblica tem lugar uma renúncia à busca histórico-crítica que permite uma maior compreensão da realidade literário-teológica do texto: esta é suplantada pela criação de ficções interpretativas de acordo com as necessidades sentidas dos crentes ou os interesses do intérprete. Sim, o mundo digital, que trouxe consigo a exaltação subjetiva, também se apresenta como destruidor da objetividade histórica, porque a considera um ponto de vista inferior e inútil, até no mesmo sentido pastoral, que gera permissões devastadoras a nível existencial e moral (notemos aqui também o falso discurso que mencionamos antes). Não há dúvida de que, quando Bento XVI e o Papa Francisco criticaram a qualidade das homilias, referiam-se não só à cansativa martelada moralista desatualizada, mas também àquela atitude fácil de um discurso adaptado a outros interesses que não implicam seguir a Cristo e contemplar o passo de Deus na sua história.

     Embora o que foi dito até aqui pretende ser uma descrição sumária do que encontramos hoje no discurso religioso, queremos também nos perguntar sobre outra questão, não menos urgente, que tem uma relação imediata com o problema religioso-discursivo atual. Como a Sagrada Escritura pode-nos ajudar a enfrentar o desafio de discursos pobres em conteúdo, mas com um grande poder manipulador na esfera religiosa a causa de sua publicidade? E, consequentemente, nos perguntamos também, como garantir uma interpretação dos textos bíblicos que nos liberte do laxismo hermenêutico subjetivista? Além de tudo isso, seria justo ainda perguntar: Como a experiência objetiva da realidade se articula nos textos bíblicos com a memória histórica e com a ficção inerente a toda produção literária?

Como o interesse urgente é pastoral, esta última pergunta não pretende ser um simples exercício acadêmico. Ao tentar respondê-la, encontramos o núcleo essencial da compreensão da Sagrada Escritura. Para entender isso, temos que nos referir à Dei Verbum, onde se estabelece que a fé judaico-cristã tem sua origem em eventos históricos, por isso o acontecido é essencial para confessar a presença de Deus em meio do suceder-se das vicissitudes humanas. Ou seja, um Deus encarnado não pode ser confessado se não a partir da convicção de que uma experiência objetiva e histórica o revela.

     O problema deriva da consideração da Bíblia como literatura, porque implica uma série de premissas importantes que importa considerar. A literatura pode ser entendida como um adjetivo para um grande número de expressões escritas, cujo grau de ligação com a realidade acontecida é diversificado. Escrever uma carta para resolver ou iluminar conflitos humanos de um grupo de pessoas distantes do remetente da mensagem, não é o mesmo que escrever uma história para educar os destinatários em determinada doutrina, onde não importa sua veracidade histórica, mas sim a verdade da mensagem transmitido por esse gênero literário. Da mesma forma, uma lei não é o mesmo que um oráculo, ou a poesia que a narração. Estes exemplos nos alertam para fazer uma distinção importante: na Bíblia encontramos tanto a história (no sentido estrito, como revisão historiográfica) quanto a ficção. Encontramos nela um gosto pelo estético, juntamente com um pragmatismo utilitário; um discurso direto na boca dos personagens principais, como um discurso indireto e decididamente parcial, expressado por um narrador.

     A ficção também nos estimula a pensar e perceber a realidade de uma forma diferente, mas isso não significa que ela seja unicamente uma obra de um gênio criativo ou fantasioso. Que diferença existe entre a mistura de historiografia e ficção literária, com a realidade experimentada e o subjetivismo produzido na era digital? A primeira resposta espontânea seria “nada”. Mas, estamos diante do mesmo fenômeno humano? Es dizer, a interpretação exegética do texto bíblico suscitada por o impacto literário do escrito, se pode semelhar a aquelas distribuídas por as redes sociais? O que diferencia os esforços exegéticos das fantasias interpretativas divulgadas sem fundamento de objetividade nas redes socias?

     Obviamente não podemos igualar o grau de expressividade e certeza doutrinária a todas as passagens bíblicas, independentemente de seus gêneros literários; embora a tendência acrítica atual seja considerar a Bíblia como uma unidade na qual cada fragmento tem o mesmo valor que o todo (uma radicalização do conceito luterano da Sola Scriptura, que se aparta facilmente de uma visão mais histórica da fé). Isto equivale a afirmar que para muita gente o gênero literário não é decisivo na compressão do texto, o que é totalmente falso e, portanto, é necessário esclarecer o alcance do valor historiográfico de cada substrato literário da Bíblia, a fim de delimitar o alcance do discurso religioso afirmado (Incluso por o pregador popular, no sentido de publicitado, conhecido, aclamado e seguido!).

     Essa tarefa deve ser compreendida não nela perspectiva da veracidade histórica, mas pela relevância da criação literária no contexto histórico-real de sua composição. É necessário, por tanto, um mínimo de conhecimento semântico e contextual para alcançar uma maior compreensão do significado do texto, porque o contrario implicaria que toda interpretação da Bíblia seria fruto da imaginação criativa e caprichosa.

     É por esta razão que na reflexão bíblica se começaram a desenvolver diferentes definições do que significa ser um verdadeiro “leitor” da Escritura Sagrada. Não há dúvida de que no centro do processo comunicativo da Palavra de Deus na Sagrada Escritura está a relação entre texto e leitor. Essa afirmação é fundamental para entender algumas coisas essenciais: 1) compreender a Palavra de Deus em seu testemunho escriturístico requer um processo hermenêutico, porque a distância histórico-cultural e politica da composição dos textos é grande demais, sem que isto signifique a impossibilidade de ter uma compreensão suficientemente fundada em considerações sintático-semânticas objetivas; 2) que existe uma importante distinção entre texto e Palavra de Deus, que pode ser exemplificada por a dupla “meio de comunicação e mensagem”, o texto é só um médio de transmissão, que pode ter varios valores comunicativos determinados por o contexto onde são proferidos; 3) que a mensagem não é independente do leitor, pois o texto que a transmite tem que ser decodificado para ser captado e compreendido, ou seja, a mensagem é dirigida a alguém que tem que entendê-la o não criá-la de maneira aleatoria. São coisas simples, mas não necessariamente óbvias, porque em primeiro lugar se tem que determinar que tipo de abordagem é adequado para entender a mensagem em uma situação comunicativa concreta, criada por a estrutura textual: o leitor tem que consentir com as indicações textuais que permitem compartilhar o mesmo contexto e código comunicativo, assim a Palavra de Deus se pode fazer evidente. A Dei Verbum já falava de algumas condições necessárias para a reta compreensão dos textos bíblicos, pois a palavra divina se expressa em palavras humanas e, portanto, é preciso compreender as formas de comunicação dos autores do texto para elucidar o conteúdo revelado por Deus. O que implica poder contextualizar os atos de expressão comunicativa no contexto interpretativo adequado e no uso da linguagem determinado por as intenções do autor. Poderíamos resumir tudo isso em uma simples pergunta: O que tipo de leitor pode perceber a Palavra divina no texto?

     Para responder poderíamos nos referir às considerações de Umberto Eco sobre o leitor modelo, a aquelas de Wolfang Iser que falava do leitor informado, e de Robert Fowler que considera os processos de desfamiliarização nos usos da linguagem. Outras propostas também são muito esclarecedoras, mas esses três autores nos permitem penetrar em um cenário possível para fazer da interpretação da Bíblia uma inspiração para pensar criticamente no mundo de hoje.

     A ideia de Eco é muito simples, mas exemplar. O texto determina quem é o leitor modelo por meio de sinais linguísticas presentes em cada uma das frases da obra. Trata-se, então, de uma série de instruções linguístico-contextuais que são necessárias para dar sentido ao que se escreve. É o que acontece com a determinação do contexto definido pelo texto para a correta interpretação do que é dito, fora desse contexto a mensagem que quer transmitir o autor é falsificado. Isso não significa que o leitor “deve” aceitar tudo o que o texto propõe, mas pelo menos ele deve consentir com uma descrição mínima das condições da comunicação. Isso implica que o que não é introduzido pelo contexto deve ser inferido do conhecimento do autor sobre o mundo linguístico-contextual, pois este é o ponto de referência básico de toda linguagem. É neste ponto que a ideia de Iser de um leitor informado é pertinente: em textos antigos são necessários certos tipos de conhecimento mínimo para poder decidir como entender o contexto literário e as declarações subsequentes. Portanto, problemas de semântica, gramática, morfologia, história, geografia e cultura tornam-se relevantes para o leitor. Se dispensarmos a ideia do leitor informado de Iser, o mundo de referência da interpretação será apenas o atual, o que facilmente levaria ao erro comunicativo.

     Duas características de um leitor crente aparecem evidentes agora: ele deve estar atento às indicações sintáticas que o orientam para a correta compreensão do que é dito; além disso, ele deve estar suficientemente informado sobre os usos linguísticos e o contexto da composição do autor. A novidade nestes dois pontos de vista é que a Dei Verbum só considerou importante a informação como meio de compreensão, mas na realidade o texto está criando uma situação comunicativa particular, aquela que é descrita por meio da linguagem, onde umas regras de ação e de configuração contextual são desenhadas ad hoc. Em outras palavras, o texto cria um mundo paralelo ao real, no que o leitor deve entrar se quiser entender as expressões que se sucedem no texto. Estas regras tem a função de evidenciar certos condicionamentos interpretativos da realidade literária e definir os âmbitos que podem ser fornecidos pelo leitor a partir de seu conhecimento enciclopédico da realidade linguística. Isto é o que permite construir uma imagem, uma intenção, uma práxis comunicativa, que se oferece ao leitor para ser aceito ou rejeitado por ele. Quanto mais se conhece o mundo do autor, mais podemos compreender o caráter ficcional da obra literária, pois ela deixa de ser uma descrição da realidade do autor, para se tornar um novo mundo de significados, ações e relações nascidas do processo de comunicação. Que relação tem esse mundo ficcional com a experiência da realidade do leitor?

     Várias coisas entram em jogo aqui. Em primeiro lugar, é fundamental a relação entre texto e história vivenciada ou conhecida pelo autor. Há um grande componente de memória nos textos bíblicos, pois a razão de escrever não é meramente estética, embora pudéssemos discutir o caráter histórico específico de alguns textos como o Cântico dos Cânticos, pois algumas obras não pretendiam ser historiográficas, mas partem da experiência humana interpretada para criar ferramentas de comunicação. Assim, a história como memória pode referir-se tanto a acontecimentos singulares quanto a interpretações mais genéricas da existência humana, ou seja, a considerações mais abstratas e menos concretas. Assim podemos entender a descrição da experiência do amor humano e da genitalidade que se relaciona com as tradições religiosas do antigo Israel nos poemas do Cântico. Responder quanto a literatura se aproxima ou se afasta da realidade concreta não faz sentido, mas sim seu caráter realista.

     Em segundo lugar, as diferentes modalidades literárias criam, por sua vez, visões de mundo diversas e às vezes até exclusivas. Poderíamos falar de perspectivas humanas, teológicas ou políticas. Mas também de coisas mais diretamente ligadas à oferta estética: a concretização do que é belo, do que é desejável e vital. Metáforas, histórias, fantasias relacionam-se com a realidade não apenas porque são vivenciadas como agradáveis, curiosas ou irônicas, mas porque elas mesmas são fonte de transmissão de conhecimento. Nas palavras de Paul Ricoeur, elas estabelecem novas relações de significado, que estão diretamente relacionadas à compreensão da vida.

     Tudo isso tem que nos fazer refletir sobre outra perspectiva de raciocínio, a desfamiliarização produzida pelo texto. Isto é, pelas impertinências predicativas que levantam a questão sobre o sentido dado ao mundo em determinado momento. Desfamiliarizar implica abrir o contexto interpretativo para outras esferas, tanto da linguagem quanto da forma como a realidade é concebida. É, portanto, é um desafio para criar novas formas de vida e de comunicação. O texto bíblico, nessa perspectiva, abre-nos para novos processos de compreensão da manifestação de Deus na história, por meio da grande gama de significados possíveis suscitada pela mesma coleção canônica de livros. Simplificando: o texto nos convida a mudar a ideia que temos de Deus para atender sua presença com maior lucidez. Isso definiria uma terceira caraterística do leitor bíblico: ele é uma pessoa aberta à mudança de pensamento e a considerar a ação de Deus como um processo que desconstrói convicções ideológicas que não permitem o crescimento da humanidade.

     Essas três características do leitor bíblico determinam uma forma de compreender não só o texto, mas também as consequências que a leitura traz para a vida das pessoas. Com efeito, entender o texto como uma produção histórico-literária e implicar dele um leitor modelo e a necessidade de um leitor informado, fala de uma abordagem da realidade que vai além da relatividade discursiva, embora concorde com a relativização de um discurso absoluto e definitivo.

     Assim, ao considerar a diversidade teológico-literária da Bíblia, notamos que a configuração dessa coleção de textos quer abranger um conjunto de perspectivas tão amplas quanto o é pensar sobre a vida. É verdade que a Bíblia nos refere a situações cultural e historicamente situadas, mas a abertura literária e a influência de correntes de pensamento não-israelitas ou judaicas que podem ser encontradas nos textos bíblicos, sem falar das controvérsias ideológico-religiosas (mesmo no NT), nos introduz no campo da paixão por compreender a existência de forma integral. Temos que afirmar que pensar dessa forma uma proposta de pensamento baseada na experiência religiosa é desafiar qualquer corrente de pensamento filosófico ou axiomático. E não só, mas também qualquer tipo de raciocínio que tenha a ver com o mundo humano vivenciado, vivido e assumido como desafio existencial.

     Agora, no cerne desse pensamento tipicamente bíblico, é preciso colocar a categoria de “memória”, não porque estamos falando simplesmente de experiências possíveis ou prováveis de personagens do passado, mas como síntese da experiência refletida e atualizada em formas literárias. Essa experiência pode recorrer à ficcionalização, não para criar mentiras ideológicas, mas porque o futuro das pessoas teve que ser moldado por imagens, que permitiam um crescimento humano integral.

     O mesmo deve ser dito do NT, mas com algumas observações preliminares. O centro dessa literatura é o querigma, mas expresso em várias formas. A mais antiga é a epistolar, que implica não só uma relação direta com as necessidades das comunidades cristãs, mas também a urgência de esclarecer o conteúdo da pregação apostólica e sua diversidade. Esta segunda afirmação tem uma importância capital, porque o evangelho foi compreendido e difundido por pessoas condicionadas cultural e religiosamente e, ainda, subjetivamente impactadas por a sua mensagem. Portanto, não é surpreendente que nos Atos dos Apóstolos se diga que alguns dos discípulos que se opunham a Paulo eram sacerdotes ou fariseus convertidos. As consequências da mensagem evangélica, iniciadas pelo evento Pascoal, não foram tão óbvias e simples de descrever ao que parece. Isso nos fala sobre a outra característica do leitor bíblico: ele deve estar aberto não apenas à diversidade de autores, gêneros literários, contextos histórico-culturais, mas também aos diversos contextos hermenêuticos contemporâneos. Podemos afirmar isso quando percebemos a diversidade presente nos escritos do NT: os materiais que estão na base de sua constituição são de origens, formas e concepções teológicas tão variadas, que são mais tolerantes, dispostos ao discernimento e ao diálogo compartilhado do que os grupos que defendem posições ideológicas excludentes na sociedade contemporânea.

     Devido a essas características, o leitor do mundo bíblico acha necessário encontrar um ancoradouro em uma realidade diversificada, mas que contém o testemunho da manifestação divina na história experimentada por pessoas pertencentes a um povo. Conversão, na linguagem bíblica, não implica imediatamente uma mudança de conduta moral, mas sim uma transformação radical de nosso paradigma conceitual religioso, cultural e político. Sem essa mudança, não ocorre uma mudança vital efetiva, o que não significa definir o que é pecado ou não, mas reconhecer a manifestação divina na vida humana de Jesus para transformar a própria. Disso decorre que a valorização de sua palavra, como discurso baseado na manifestação de Deus na história e delineado em determinada manifestação literária, determina um tipo particular de intérprete de sua comunicação e do modo de enfrentar o mundo.

     Por todas essas razões, não importa tanto o grau de ficção dos textos bíblicos, o que importa é a relação que esse texto teve com a história desde o momento de sua composição até atingir sua forma canônica. Porque este é o testemunha de um espírito de atualização incessante, nos é apresentada como um desafio interpretativo, como uma razão para descobrir a profundidade da vida e como uma oportunidade para buscar nossa liberdade em meio a tantas mentiras digitais que nos negam a oportunidade de viver com um sentimento de busca permanente pela liberdade.

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